Sessão na Câmara debate sobre legislação e respeito às religiões de matriz africana

por Acácia Merici, Assessora de Imprensa do parlamentar — publicado 14/09/2018 17h10, última modificação 17/09/2018 08h02
Sessão na Câmara debate sobre legislação e respeito às religiões de matriz africana

Foto: Gilton Rosas

A Câmara Municipal de Aracaju (CMA) realizou nesta sexta-feira, 14, uma Sessão Especial com o tema "Legislação Municipal e os povos tradicionais de matrizes africanas e terreiros: dialogando o dever do Município e os direitos de quem tem essa crença." A solenidade foi presidida pelo vereador Professor Bittencourt (PCdoB).

"Este é um tema que diz respeito a toda sociedade. As religiões de matrizes africanas foram incorporadas à cultura brasileira quando os primeiros escravizados desembarcaram no Brasil e encontraram na religiosidade uma forma de preservar as tradições, idiomas, conhecimentos e valores trazidos da África. Hoje, precisamos cada vez mais chamar a atenção para a luta e o combate à intolerância e a todo tipo de preconceito. Temos o dever de debater e garantir o direito à fé e à diversidade religiosa, discutindo políticas de proteção e segurança dos terreiros. Assim, será possível preservar a manutenção cultural, histórica e social dessas tradições", afirmou Bittencourt.

A abertura da Sessão contou com a saudação da Yalorixá Rita Tassitaô e do Pai Marcos Xoroquê, do Coletivo de Ekédes e Ogans do Estado de Sergipe. Para o escritor Enéas Gabriel Resende, Bababalorixa Historiador, pós-graduado em Ensino para Igualdade Racial Gênero e Diversidade, e vice-presidente da Academia Riachuelense de Letras, Ciências e Artes, o evento foi fundamental para reforçar a garantia dos direitos.

"O sentimento é muito forte, especialmente em tempos de conflito ideológico, racial e religioso. Enquanto pesquisador da cultura africana, vejo que o Brasil pede socorro. A luta pela permanência das nossas leis deve ser constante", disse.

A Ialaxé Martha Sales também participou da solenidade. Ela é mestranda em Antropologia e fundadora da Sociedade Omolàiyé. "É importante que o município esteja sempre atento para criar e fortalecer mecanismos. Os espaços devem ser ocupados por todos os cidadãos. Precisamos ser vigilantes e ter conhecimento de toda legislação para que possamos pleitear os direitos. Luto diretamente pelo empoderamento dos grupos comunitários e povos de terreiro que faço parte. As fronteiras para mudar os espaços de poder passam por uma conscientização política. O mergulho é mais profundo", pontuou.

A Ialorixá Sônia Oliveira Santos é pedagoga, mestre em Políticas Sociais e fundadora da Comunidade Ojú Ifá. Ela falou sobre a sacralização, a importância e o respeito aos animais nas religiões de matriz africanas.

"Estamos sempre dispostos a esclarecer sobre como cuidamos dos animais. Somos judicializados pela sociedade, pelo Estado e por nós mesmos. Para fazer o enfrentamento precisamos estar organizados. Temos que ter um novo espaço político para dialogar com os mais diversos pares. Discutimos a institucionalização e materialização do terreiro dentro dos moldes. Quando os poderes forem falar da nossa religião, sugiro que nos procure para debater e conhecer. Precisamos pensar em legislações que vão nos acolher. Nossa religião exite porque cultivamos os elementos naturais. Parte da natureza está preservada porque os senhores e senhoras do axé cuidam. Somos pessoas que têm sabedoria. Convidamos as instâncias de poder para conversar. O poder também está do lado de cá porque movimentamos nações e representamos um povo", afirmou.
Para a Mamet' N'sice Meire Mansuet, delegada de Polícia e titular da Delegacia de Atendimento a Crimes Homofobicos, Racismo e Intolerância Religiosa, as pessoas precisam denunciar todos os atos de racismo.

"O Brasil é campeão em leis. Mas na hora de aplicar, as políticas não correspondem a realidade. A lei do racismo tem quase 30 anos mas o direito não é exercido. É proibido qualquer ato de preconceito pela questão da cor, da religião. Dizem que há maus tratos aos nossos animais. Há um grande equívoco. Rezamos, banhamos e respeitamos o animal. A pessoa é escolhida pela divindade para tratar o animal. O que falta é consciência política para a ocupação dos espaços de poder. O grande problema ainda é a falta de conhecimento", destacou.

Representando a Comissão de Liberdade Religiosa da OAB - Seccional Sergipe, Diego Rosário, comentou que "a constituição possui leis genéricas garantindo o estado laico, mas faltam leis específicas para que possam ser cobradas. Poucos somos provocados. Estamos a disposição para tirar dúvidas e fazer os encaminhamentos necessários. Sou candoblecista e muitos preconceitos podem ser quebrados com o diálogo".

O promotor do Ministério Público Estadual, da coordenação de igualdade racial, Luiz Fausto Valois, destacou que é preciso fortalecer os canais de diálogo. "O Estado tem o dever de zelar pelas religiões de matriz africana. Não preciso esconder minha religiosidade no dia a dia porque a constituição garante a liberdade religiosa a todo cidadão brasileiro. Muita gente, às vezes, não sabe dos seus direitos. Precisamos quebrar a timidez e levar conhecimento aos povos tradicionais. A ignorância leva ao preconceito. Uma nova geração não está se escondendo. Temos que acabar com o racismo religioso", disse.

A Sessão Especial Legislação Municipal e os povos tradicionais de matrizes africanas e terreiros foi prestigiada por educadores, juventude, pelo vereador Iran Barbosa, pela ex-vereadora Lucimara Passos, pelo produtor cultural da Casa das Africas, Pedro Neto Daressy, pela secretária de direitos e igualdade racial de Laranjeiras, Sandra Sena, membros do Centro Cultural Erukerê, membros do grupo Os Caatingas.