Sessão Especial na Câmara de Aracaju debate e encaminha ações para o fortalecimento das mulheres negras na sociedade

por Priscila Viana- Assessoria de Imprensa da Parlamentar — publicado 28/10/2024 07h00, última modificação 04/11/2024 17h19
Sessão Especial na Câmara de Aracaju debate e encaminha ações para o fortalecimento das mulheres negras na sociedade

Foto: China Tom

Convocada pela vereadora Professora Sonia Meire (PSOL) e realizada na manhã desta segunda, 03, uma Sessão Especial sobre mulheres negras reuniu representações da sociedade civil, movimentos sociais e do Poder Público na Câmara Municipal de Aracaju (CMA). A Sessão “Dia Municipal da Mulher Negra – Rejane Maria Pureza do Rosário e o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha” faz alusão ao Dia Internacional, Nacional e Municipal da Mulher Negra, comemorado no dia 25 de julho.

Na ocasião foram debatidos temas essenciais à garantia de direitos, ao fortalecimento de políticas públicas e ao bem viver das mulheres negras, entre outros. “Qual Aracaju queremos para o nosso futuro?”, questionou a integrante do Coletivo Negro Beatriz Nascimento e graduada em Direito, Stefany Caroline. Para ela, a vivência da mulher negra passa pelo fortalecimento das políticas públicas.

“Sabemos muito bem que Aracaju não é uma cidade branca. A gente vê muitas pessoas negras em todos os bairros, é realmente uma cidade de maioria negra. E cadê as pessoas negras ocupando os espaços de decisão e de poder? Cadê essas pessoas aqui no plenário hoje, reivindicando as suas pautas? Vejo nas propagandas que Aracaju é a cidade da qualidade de vida, ao mesmo tempo em que nós, mulheres negras, não temos essa qualidade de vida e não estamos aqui representadas. Nós estamos nas ruas nos índices de desemprego, nos presídios. E para mudar essa realidade, é necessário que haja políticas públicas”, afirmou Stefany.

A gerente do Observatório Beatriz Nascimento, ligado à Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres de Sergipe, Erika Leite Santana, pontuou a importância das mulheres negras disputarem o orçamento para a viabilização de políticas públicas essenciais à garantia de direitos. “Sabemos onde está a mulher negra na nossa cidade, mas precisamos nos munir com dados, ter dados que identifiquem de forma detalhada a presença e atuação dessa mulher negra, que indiquem quais são as violências que perpassam suas vidas, além do racismo, suas rendas, necessidades relacionadas à saúde, educação, moradia. E a partir desses dados, disputar o orçamento. Sem orçamento, não existe política pública. O lugar da mulher negra é no Orçamento”, destacou Erika.

A vereadora Sonia Meire aproveitou a pauta para destacar a importância de as mulheres negras se fazerem presentes nos espaços políticos, para disputar a narrativa, a criação das políticas públicas e as prioridades no orçamento público. “O nosso desejo não é ser pontes, mas que o povo preto ocupe os espaços que lhe são negados. A nossa luta é para reverter essa situação. É muito importante que vocês estejam aqui hoje e todas as vezes em que rearticular. Nós estamos prestes a votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias para o próximo ano agora em julho e precisamos estudar e fortalecer a nossa incidência sobre o orçamento”, destacou a vereadora.

Reeducação e liberdade

A articuladora da Agenda Nacional pelo Desencarceramento, da Frente Sergipana pelo Desencarceramento e conselheira do Comitê de Prevenção e Combate à Tortura, Iza Negratcha, levantou dados que mostram a vulnerabilidade a que as mulheres negras estão inseridas, principalmente no contexto das diversas violências de Estado.

“Apenas 3% das mulheres negras ocupam os espaços de poder, mas elas são a maioria nas piores estatísticas. Nós temos hoje no Brasil mais de 42 mil mulheres encarceradas, 47% dessas mulheres são negras e a maioria responde por tráfico de drogas. Essa é a alternativa financeira para muitas que não conseguem oportunidades de trabalho. Temos hoje em Sergipe 189 mulheres ocupando o Presídio Feminino, e não temos dados sobre quantas delas são negras. Não estamos aqui apenas para sobreviver, nós queremos uma vida com qualidade, não apenas sobreviver. A gente quer existir, a nossa luta é pra que a gente exista e resista todos os dias, porque sobreviver a gente já faz isso desde que nascemos.  todas nós” destacou Negratcha.

Outra convidada presente à mesa, a dançarina, integrante do Movimento Hip Hop e graduada em Administração, Jhully Souza, que tem uma longa trajetória no âmbito da cultura, ratificou as colocações de Iza. “Desde que entrei no hip hip, comecei a entender melhor muitas dessas questões que sempre me incomodaram. O mínimo de que precisamos é respirar, não queremos apenas sobreviver. Por isso, entendo que a minha maior missão é reeducar. Faço parte de um coletivo que a gente tenta diuturnamente levantar diálogos e levar ações para a comunidade periférica e é aí onde precisamos atuar, na reeducação”, afirmou Jhully.

Beatriz Nascimento e Rejane Maria

As memórias de Rejane Maria e Beatriz Nascimento foram lembradas durante toda a Sessão Especial, pela memória que construíram de luta e resistência das mulheres negras em destaque na sociedade.

Mulher negra, mãe, historiadora, roteirista, poeta e ativista, a sergipana Beatriz Nascimento impulsionou debates no movimento negro e colaborou para o pensamento social brasileiro, principalmente a partir de suas pesquisas sobre os quilombos como sistemas alternativos à estrutura escravista, com potencial continuidade em favelas, particularmente no caso do Rio de Janeiro. Foi vítima de feminicídio em 1995, praticado pelo “companheiro” de uma amiga, quando Beatriz tentava defendê-la das agressões dele.

Já Rejane Maria Pureza do Rosário foi uma militante negra que durante toda a vida dedicou-se à cultura e religiosidade negras e foi uma das fundadoras do Grupo ABAÔ de Capoeira Angolano, que promove trabalhos de base em comunidades periféricas, ações com a juventude nas escolas; e, articulado com outros movimentos sociais, dialoga com órgãos e instituições sobre a condição das mulheres negras sergipanas.

As respectivas memórias foram destacadas pela agente comunitária e educadora popular Josineide Dantas, em prosa e verso. “Rejane Pureza, como eu gosto de chamar, e Beatriz, muito nos ensinaram. Onde estiverem, estão nos guiando e não devem estar muito felizes. Pois, nós, mulheres negras, nunca estamos muito felizes nessa sociedade racista. Por isso, é nosso dever defender o nosso povo e seguir lutando”, destacou Josineide, popularmente conhecida como Gigi Poetisa. Gigi integra o setorial de negras e negros do PSOL, a Rede de Mulheres Negras de Sergipe, a Rede de Mulheres Negras no Espaço de Poder do Nordeste, a coordenação do Fórum de organizações Negras de Sergipe e o Movimento Negro Unificado em Sergipe (MNU-SE)