Lei Maria da Penha: Sonia Meire realiza Audiência Pública no dia em que a lei completa 17 anos
A violência doméstica foi o tema principal da Audiência Pública “17 anos da Lei Maria da Penha”, realizada pela vereadora professora Sonia Meire (PSOL) na manhã desta segunda, 7, na Câmara Municipal de Aracaju (CMA). A audiência realizada nesta segunda-feira compõe uma série de Audiências Públicas e Sessões Especiais convocadas pela vereadora do PSOL com o objetivo de reunir elementos, dados e relatos que sejam capazes de embasar as proposituras para a votação da Lei Orçamentária Anual (LOA) para o próximo ano.
“Estamos juntando forças para interferir no orçamento municipal do ano que vem, para priorizar emendas que possam contribuir para a melhoria das políticas públicas no campo da defesa e da proteção da mulher. Precisamos reunir as mulheres para garantir o apoio e a pressão popular no momento da votação e aprovação da LOA, pois sozinhas não conseguimos mudar essa realidade”, afirmou a vereadora professora Sonia Meire.
A mesa da Audiência Pública foi bastante representativa, com mulheres negras, com deficiência, LGBTQIAPN+, atuantes nos ramos da Segurança Pública, da Educação, do Poder Jurídico e integrantes de movimentos feministas auto organizados. Para debater o tema, foram convidadas a coordenadora da ronda Maria da Penha da Guarda Municipal de Aracaju (GMA), Vilieanne Brito; a fundadora do Programa Patrulha Lei Maria da Penha, Vaneide Dias; a integrante da Auto Organização De Mulheres Negras Rejane Maria, do Núcleo de Mulheres Negras Omiró, da Rede de Mulheres Negras de Sergipe e da Rede de Mulheres Negras do Nordeste, Alessandra Santos; a coordenadora do grupo Juntos pelo TEA, Juntos pela Inclusão, Suzilane Menezes; a procuradora do município de Aracaju, Denise Andrade; e a assessora parlamentar da deputada estadual Linda Brasil (PSOL), Geovana Soares.
Prioridade no orçamento público
De acordo com a coordenadora da ronda Maria da Penha da Guarda Municipal de Aracaju (GMA), Vilieanne Brito, que atua diariamente no trabalho de proteção às mulheres vítimas de violência doméstica, um dos maiores desafios é o de sensibilização da sociedade. “Qual a responsabilidade de todas e todos no combate à violência doméstica e familiar? Enquanto nós não assumirmos a responsabilidade coletiva nesse enfrentamento, ainda vamos sofrer muito. Não adianta fazer discurso bonito e fechar os olhos diante da violência quando ela está do nosso lado, seja no nosso trabalho, na família, no nosso meio de amigos. Precisamos mudar a cultura na prática”, afirmou a coordenadora da ronda.
Para a fundadora do Programa Patrulha Lei Maria da Penha, Vaneide Dias, embora a Lei Maria da Penha represente uma conquista para as mulheres, precisa ser melhor debatida e priorizada para o encaminhamento coletivo de soluções. “A Lei Maria da Penha precisa ser comemorada porque salva vidas todos os dias, mas precisamos apontar os gargalos. É uma lei viva, se atualiza todos os anos. E nos últimos anos, ela sofreu uma diminuição orçamentária e precisamos amadurecer uma dotação orçamentária mínima. Temos um conselho, temos um plano municipal e não conseguimos executar por falta de orçamento. O dossiê da mulher aracajuana precisa ser construído. As políticas públicas para a erradicação da violência contra a mulher precisam ser prioridade no orçamento público”, destacou Vaneide.
A coordenadora do grupo Juntos pelo TEA, Juntos pela Inclusão, Suzilane Menezes, relatou sua experiência de violência doméstica, seguida da falta de assistência e acolhimento por parte da gestão municipal de Aracaju. “Eu fui violentada pelo meu ex-marido e continuo sendo violentada pela falta de políticas públicas na prática. Até hoje eu não recebo nenhum tipo de benefício do município. Sofri violência em 2017 e meu número na fila do atendimento psicológico, que nunca chegou, é 1.560. O que precisamos é de concurso público e qualificação das pessoas que podem nos acolher nos órgãos públicos”, defendeu Suzilane, que também é mãe de um adolescente com transtorno do espectro autista (TEA).
Informação e educação
A procuradora do município de Aracaju, Denise Andrade, a eficácia da Lei Maria da Penha depende de uma série de fatores. “Todo mundo de certa forma tem algum relato, seja por relato pessoal ou vivência próxima, sobre a violência contra a mulher. Nós mulheres somos acostumadas a nos proteger, como se estivéssemos sempre em risco. A violência contra a mulher está em diversos cenários e o principal meio de diminuir essa violência é a questão da educação. É uma questão multidisciplinar, tem que ser debatida sobre vários vieses. A nossa legislação é excelente, mas realmente precisa ser colocada em prática”, afirmou Denise.
Para a assessora parlamentar da deputada estadual Linda Brasil (PSOL), Geovana Soares, a aplicabilidade da Lei Maria da Penha precisa ser destacada para todas as mulheres, mas principalmente para as mais vulnerabilizadas. “A violência contra a mulher é uma questão estrutural da sociedade. Por isso, é importante destacarmos o recorte da Lei Maria da Penha para as mulheres trans e travestis. Já que o feminicídio é uma violência contra a mulher pela sua condição de ser mulher, as mulheres trans e travestis também estão inclusas nessa legislação. E isso precisa ser amplamente divulgado para que as mulheres trans e travestis, sobretudo as que estão nas esquinas, às margens da sociedade, saibam que têm acesso a essa lei e que podem solicitar a medida protetiva”, explicou Geovana.
A integrante da Auto Organização de Mulheres Negras Rejane Maria, do Núcleo de Mulheres Negras Omiró, da Rede de Mulheres Negras de Sergipe e da Rede de Mulheres Negras do Nordeste, Alessandra Santos, destacou as limitações da lei para as mulheres mais vulnerabilizadas. “Nós entendemos que a lei é importante, mas tem uma diversidade de mulheres onde essa política não chega. E para que possamos analisar essas limitações, não basta punir o agressor. Como educadora, chamo atenção para a urgência da prevenção dessa violência nas escolas, pois é o local onde a criança e o adolescente está aprendendo a ser violento”, afirmou Alessandra.
Dados alarmantes
A Lei nº 11.340, sancionada pelo presidente Lula em 2006, foi batizada de Lei Maria da Penha em homenagem à cearense Maria da Penha, farmacêutica bioquímica que foi vítima de diversas tentativas de homicídio pelo seu ex-marido. Uma delas a deixou paraplégica. Maria da Penha tornou-se um ícone na luta pelos direitos das mulheres e contra a violência doméstica.
Cerca de 36% das mulheres no Brasil declararam já terem elas próprias sofrido alguma forma de violência doméstica, sendo a violência psicológica e a violência física as formas mais relatadas, de acordo com dados da pesquisa Redes de apoio e saídas institucionais para mulheres em situação de violência doméstica no Brasil, realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec) e divulgada no ano passado.
Ainda de acordo com a pesquisa, 57% dos brasileiros conhecem alguma mulher que já foi vítima de ameaça de morte pelo atual parceiro ou ex, e 37% conhecem uma mulher que já sofreu tentativa ou foi vítima de feminicídio íntimo. Os dados são graves e apontam a urgência das ações e políticas públicas de prevenção e combate à violência contra a mulher.
Com relação às ações de proteção, entre os anos de 2021 e 2022, o número de medidas protetivas de urgência concedidas para as mulheres em Sergipe praticamente dobrou – de 1.261 em 2021 para 2.503 em 2022, de acordo com dados do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJ/SE). O crescimento de 98% no número de medidas concedidas coloca Sergipe no topo de um ranking perverso e violento: o estado nordestino com o maior aumento quando o assunto é concessão de medidas protetivas de urgência para as mulheres vítimas de violência.